Em Rio Preto, vencedor do Prêmio Jabuti diz que propõe uma literatura acessível

“O que eu proponho é uma literatura que seja acessível. Isso é bastante consciente. Eu quero formar leitores.” É com essa frase que o escritor Jeferson Tenório encerrou a entrevista concedida ao Diário da Região. Vencedor do Prêmio Jabuti — a mais importante premiação literária do Brasil —, o autor esteve em Rio Preto na última terça-feira, 8 de julho, para lançar seu novo livro, “De onde eles vêm”. O bate-papo aconteceu no Teatro do Sesc.
Considerado uma das vozes mais relevantes da literatura brasileira contemporânea, Jeferson é autor de quatro obras: “O beijo na parede”, “Estela sem Deus”, “O avesso da pele” e “De onde eles vêm”. Ganhou projeção nacional quando “O avesso da pele” — vencedor do Jabuti em 2021 — foi alvo de censura por parte de governantes estaduais. Com mais de 200 mil exemplares vendidos, o livro já teve seus direitos adquiridos por países como Portugal, Itália, Inglaterra e França. Agora, o autor retorna aos holofotes ao retratar a realidade de alunos cotistas, logo após a implementação do sistema de cotas no Brasil.
O LIVRO
“De onde eles vêm” conta a história de Joaquim, um jovem negro e periférico de Porto Alegre que, por meio do sistema de cotas, ingressa no curso de Letras em uma universidade pública. Joaquim é um jovem sonhador, que deseja viver da escrita, mas logo se depara com uma sensação de não pertencimento, como se não merecesse estar naquele ambiente. Aos poucos, percebe que a diferença entre ele e os demais alunos não está na capacidade intelectual, mas nas oportunidades e nos privilégios acumulados ao longo da vida.
Ao narrar a história de Joaquim, Tenório narra uma história coletiva, colocando em evidência a realidade que muitos alunos cotistas viveram e vivem ainda. “Historicamente, a universidade é hostil para todo mundo. Mas, para a comunidade negra e periférica, é ainda pior. Você tem um espaço de muita competição, que muitas vezes o que interessa é o desempenho. Você precisa produzir muito sem ter reflexão do que está sendo produzido. Eu acredito que melhorou muito o sistema de cotas desde quando eles foram instalados, mas o que parece é que ainda falta apoio na manutenção desses alunos na universidade”, revela.
EDUCAÇÃO
A educação é um tema constante na obra de Tenório. Em todas as suas histórias, os protagonistas negros têm, de alguma forma, acesso ao conhecimento, seja por meio dos livros ou o acesso às universidades. Segundo ele, na verdade, escrever essas histórias “é uma tentativa de deslocar a experiência negra, que é sempre marcada por violência e pelo racismo, e tentar mostrar uma trajetória intelectual”.
“Hoje, eu me convenço de que escrevi o mesmo personagem sempre. Muda o gênero, a idade, mas é como se fosse o mesmo personagem, porém todos em busca desse espaço do conhecimento, do pensamento. Uma mulher negra que pensa é algo muito potente, como acontece em ‘Estela sem Deus’. A educação aparece como uma ferramenta de transformação interior. Primeiro, vem a consciência racial e social; depois, a partir dessa organização interna, o personagem passa a interferir no mundo. É isso que eles buscam com o conhecimento que adquirem”.
LEITORES
Ao contar histórias de pessoas silenciadas e invisibilizadas pela sociedade, Tenório diz buscar escrever os livros que gostaria de ter lido quando jovem, e acredita que por isso maioria de seus leitores é formada por jovens.
“Na narrativa, o que eu quero é que o leitor pegue o meu livro e não largue. Essa é a minha intenção. O que eu proponho é que seja uma literatura acessível. Quero formar leitores”.
“O que mais me realiza é ver pessoas que não são leitores se tornarem leitores. Acho que esse é um momento mágico. E se os meus livros puderem fazer essa ponte, eu chegar nesse momento, para mim é o maior prêmio, uma realização”, finaliza.