HB capacita equipes para ampliar doações de órgãos na região

“Nós pensamos que da tristeza que estávamos vivendo poderíamos proporcionar alegria para outras pessoas, que poderiam ir embora com seus filhos, já que nós não poderíamos ir com o nosso.” A frase é de Nilton Cezar da Silva, funcionário público de 52 anos, pai de Cesar Henrique Souza da Silva, que teve morte encefálica aos 19 anos, depois de um acidente de carro. O jovem cursava engenharia elétrica.
Nilton conta que ele e a mulher, Maria José Souza da Silva, cabeleireira de 54 anos, decidiram imediatamente pela doação de órgãos do filho — todos foram doados, inclusive as córneas —, dando nova vida a quem aguardava na fila por uma nova chance. Tão logo foram abordados pela equipe de captação e conscientizados a respeito de como funciona o processo, a decisão se tornou clara. “A gente tem uma alegria imensa de saber que outras pessoas estão vivendo. Não ameniza a dor, mas é uma sensação de que fizemos o certo. Todo mundo deveria pensar desta forma.”
Rio Preto é referência na captação e doação de órgãos. Na região, 65% das famílias abordadas dizem “sim” à doação, enquanto no Brasil este índice é de 45%. A Organização de Procura de Órgãos (OPO) do Hospital de Base é quem coordena as equipes, responsáveis por cobrir uma área de aproximadamente 2 milhões de habitantes. Por aqui, são 47 doadores por milhão de habitantes, índice muito próximo ao da Espanha, referência mundial em transplantes, com 50 doadores por milhão. O noroeste de São Paulo tem mais que o dobro da média do Estado (21) e do Brasil (18). Cada doador pode salvar até oito vidas.
Evento
O Brasil tem o maior sistema de doação de órgãos público do mundo, e aumentar o número de famílias que dizem “sim” é o objetivo de um evento que reúne aproximadamente 60 profissionais de saúde de 23 hospitais da região, desde sexta, 4, até este sábado, 5 de julho, no Hotel Hyatt Place de Rio Preto. A ação é organizada pela OPO.
De acordo com João Fernando Picollo de Oliveira, coordenador da OPO do HB, o treinamento é voltado para médicos, enfermeiros, assistentes sociais e psicólogos. Para os médicos, há capacitação sobre o diagnóstico e o protocolo de morte encefálica e os critérios legais, clínicos e éticos envolvidos. Toda a equipe aprende sobre como abordar as famílias em um momento tão delicado e conversar sobre a doação de órgãos. “É preciso dar um alívio emocional, um acolhimento adequado, para que possam tomar a melhor decisão”, explica Picollo, ressaltando que é um direito da família recusar o pedido.
O especialista explica que todos os profissionais que atuam em unidades de terapia intensiva (UTI) e emergências da região são capacitados para fazer o diagnóstico de morte encefálica e abordar as famílias. Embora os índices por aqui sejam bons, sempre há como melhorar, avalia Picollo.
Participam do encontro médicos, psicólogos e profissionais de enfermagem do Hospital de Base, Hospital da Criança e Maternidade, Austa Hospital, Hospital Beneficência Portuguesa e Hospital Hapvida, Santas Casas de Rio Preto, Fernandópolis e Votuporanga, Hospital Padre Albino e Hospital Emílio Carlos, de Catanduva, entre outros.
Diálogo
O médico reforça que, no Brasil, a única autorização para doação de órgãos deve vir da família. A pessoa até pode deixar expressa seu desejo em cartório, por exemplo, mas o documento nada vale se a família não consentir com a coleta. “É fundamental que quem deseja ser doador tenha essa conversa, porque quem autoriza é a família, e muitas famílias que abordamos falam que não sabem qual era o desejo da pessoa, porém quando há essa ciência, a tendência é que a vontade seja respeitada.”
Atualmente, quase 80 mil pessoas aguardam um órgão ou tecido no Brasil, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Os com fila mais longa são córnea, rim, fígado e coração.
Somente um transplante é capaz de devolver a qualidade de vida e, em grande parte dos casos, de salvar a vida de quem está nessa espera. “A fila de espera aumenta cada vez mais porque as pessoas estão mais hipertensas, diabéticas e vivendo mais tempo, portanto têm mais lesões crônicas em órgãos vitais. Sempre vamos precisar de doação para ajudar e salvar as pessoas”, ressalta Picollo.