'Nova' gasolina não deve trazer tanta economia e exigirá cuidados

O governo federal confirmou que testes feitos pelo Instituto Mauá comprovaram a viabilidade técnica da gasolina E30 no Brasil. Com 30% de etanol na mistura, contra 27,5% da mistura atual, a nova gasolina vem sendo discutida desde 2023 com a promessa de reduzir a emissão de poluentes e a importação de gasolina.
Segundo o Ministério de Minas e Energia, A transição do E27 para o E30 evitará a importação de 760 milhões de litros de gasolina por ano, impulsionando a produção nacional de biocombustíveis. Segundo o ministro, isso representará um aumento de 1,5 bilhão de litros na demanda por etanol e um investimento estimado em R$ 9 bilhões no setor.
O governo trabalha para a nova mistura chegar às bombas em maio deste ano. No entanto, para a nova mistura chegar aos postos, é necessário o sinal verde do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) ainda neste ano.
O aumento do percentual de etanol na gasolina foi garantido após a sanção, por parte do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, a lei que regulamenta e cria programas de incentivo à produção e ao uso de combustíveis sustentáveis, como o diesel verde e o biometano. Entre outras medidas, a nova legislação também altera os percentuais de mistura de etanol na gasolina, que passará a ter um mínimo de 22% do biocombustível, podendo chegar a até 35%.
O presidente-regional do Sincopetro, Roberto Uehara analisa a nova gasolina como favorecimento político para empresas da cadeia produtiva do etanol. “Acho que a qualidade da gasolina vem caindo toda vez que o governo federal faz esse tipo de adequação. 27% já é um percentual muito alto e esse aumento de 30% é um nível muito alto que acaba afetando a gasolina. Está mais utilizando o lado político, o favorecimento de algumas partes do elo da cadeia de distribuição do que qualquer outra coisa”, afirma.
“É lógico que existem veículos que vão, de certa maneira, aceitar o consumo desse produto, mas existem muitos tipos de veículos que não vão se adaptar. Acho que vai dar problema, mas, se o instituto está falando que já foi feito o teste e até agora não deu problema, vamos aguardar”, diz.
OTIMISMO
Por outro lado, o CEO da Rede de Postos Monte Carlo, Eduardo Munhoz, vê a iniciativa do governo com otimismo. Segundo ele, a valorização do etanol é um ponto importante. “Considero, acima de tudo, uma medida estratégica que alia sustentabilidade, redução de emissões e, até mesmo, mais opções para consumidor”, diz.
PREÇO
Por outro lado, o impacto desta medida no bolso do consumidor ainda gera cautela por parte dos economistas. Isso porque, apesar de o etanol ser um produto mais barato, não se espera que o aumento de sua presença da gasolina provoque uma queda no preço do derivado do petróleo nas bombas.
“Exceto caso ocorra a migração de consumidores que antes abasteciam com gasolina e que agora, pagarão por gasolina, mas levam 30% de etanol, então é melhor pôr o etanol direto, provocando a queda na demanda e no preço da gasolina”, afirma o economista José Mauro da Silva.
Ao ser questionado se haveria queda no preço da gasolina, o presidente da Sincopetro diz que o cenário ainda é incerto, mas que a queda do preço não deve ocorrer. “O Brasil vem atravessando um momento econômico muito difícil. Não creio que vá acontecer essa tão falada redução”, diz.
O economista Bruno Sbrogio concorda que a mudança não trará barateamento na gasolina porque, se por um lado a demanda pelo derivado do petróleo cai, por outro, aumenta a demanda pelo etanol. “Quando você aumenta a demanda por um produto, se você não tem um aumento proporcional na produção daquele produto, você tem um aumento de preços inevitável”
CONSUMO E CUIDADOS
Outro ponto abordado é o desempenho e os cuidados necessários com o veículo em função desta porcentagem. “A gasolina é mais econômica que o etanol, mas à medida que você vai colocando mais etanol na gasolina, a performance entre os dois combustíveis também vai se aproximando”, diz Bruno Sbrogio.
Pelo lado mecânico, a troca não traz problemas para os veículos flex, mas sim para aqueles que só têm um tipo de combustível, sobretudo os mais antigos, que usam carburador e também as motos.
“Nos últimos 20 anos os motores já estão projetados para receber os 27% de álcool com a gasolina brasileira. Entretanto, este aumento de 3% pode afetar componentes internos, desempenho e até aumentar a poluição. Pode afetar mangueiras, vedações, sistema de alimentação, corrosão, bomba de combustível, bicos injetores, carburadores”, diz Rafael Andrade Ferreira da Silveira, coordenador-técnico da Escola do Mecânico de Rio Preto.
“Os sistemas de injeção modernos, tanto multiponto quanto direta, possuem margens de correção adaptativa via sensores de oxigênio e mapas de compensação pré-definidos, sendo aptos a operar com variações moderadas na composição do combustível”, afirma o engenheiro mecânico Fernando Luiz Helena.
“Veículos equipados com motores GDI tendem a apresentar maior sensibilidade a alterações de combustível devido à formação de depósitos na ponta dos injetores. Entretanto, o etanol possui ação solvente e tende a contribuir com a limpeza do sistema de injeção e da câmara de combustão, o que pode representar um benefício secundário”, finaliza. (Colaborou Ana Beatriz Aguiar)